quinta-feira, 25 de março de 2010

O MEU PAI

Quando eu era criança o meu pai olhava com admiração sincera para todos os desenhos que eu fazia; quando lhe pedia a opinião, ele examinava cada frase rabiscada como se fosse uma obra-prima; ria-se às gargalhadas das piadas mais insípidas e de mau gosto. Sem a confiança que ele me deu, teria sido muito mais difícil tornar-me escritor (…)

Adorava quando ele me levava a ver filmes, e adorava ouvi-lo discutir os filmes que tínhamos visto com outros; adorava as piadas que ele fazia sobre a idiotice, o mal e a desumanidade, tal como adorava ouvi-lo falar acerca de uma nova variedade de fruto, uma cidade que visitara, as últimas notícias ou o livro mais recentes (…) Adorava quando ele me levava para um passeio, porque, juntos no carro, sentia, pelo menos por algum tempo, que não o iria perder. Quando ele conduzia, não podíamos olhar-nos nos olhos, e então ele falava-me como amigo, tocando nas questões mais delicadas.

Mas o que eu mais gostava era de estar perto dele, de lhe tocar e de estar a seu lado.(…)



Orhan Pamuk
(Prémio Nobel da Literatura 2006) – Outras Cores (p.26-27)
(sugerido por Luísa M. Saraiva, coordenadora da Biblioteca)

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